Antes de boa parte do pedral
ser destruída, empresas voltam a explorar, 50 anos depois, gemas preciosas no
Rio Tocantins
Muitas pessoas não sabem, mas
a região do Pedral do Lourenção, entre Itupiranga e Nova Ipixuna, já foi palco
de um popular garimpo de diamantes e cristal a partir da década de 1930,
ocasionando uma intensa imigração de garimpeiros e comerciantes para a região.
Diferente do passado, quando
os garimpeiros utilizavam escafandros para chegar ao fundo do rio – muitos
homens morreram nessa aventura – atualmente as duas empresas utilizam métodos
mais modernos.
Uma delas faz uso de
mergulhador, que fica em média duas horas e meia no fundo do rio com um jato
d’água potente e uma lanterna para retirar cascalho e levar para uma balsa que
flutua no rio. Lá, o material mais fino fica depositado em uma peneira grande
para, posteriormente, ser analisado criteriosamente com a ajuda de uma bateia
(no mesmo modelo usado em Serra Pelada)
A segunda empresa, mais
sofisticada, utiliza equipamentos modernos e dispensa o uso de mergulhador. Um
sistema de sonar preciso, com ajuda de um programa de computador avançado,
auxilia a levar uma mangueira que faz a sucção do cascalho do fundo do rio para
a superfície, onde o material é analisado criteriosamente. Embora utilize menos
pessoas, o custo de manutenção é alto, pois os potentes motores da empresa
consomem cerca de 1.000 litros de óleo diesel por dia. Duas balsas realizam a
exploração no rio em busca de diamante e ouro.
Ninguém nas duas balsas falou
diretamente com a Imprensa. O responsável pela menor ficou bastante nervoso e
garantiu que o proprietário possuía todas as licenças do DNPM (Departamento
Nacional de Produção Mineral). “Ele lutava por essa licença há dez anos e só no
final do ano passado ela foi liberada”, contou.
O dono, segundo ele, é do
Paraná e tem longa experiência em garimpo de ouro e diamante em rios. Também
tratou de garantir que o trabalho deles não faz uso de mercúrio para atrair o
ouro nas bateias. “A gente não agride o meio ambiente. Tudo que é retirado do
fundo do rio volta para lá novamente”, alegou.
Os garimpeiros chegaram ao
Pedral do Lourenção em outubro do ano passado. A primeira empresa trabalha com
quatro mergulhadores. Cada um entra na água duas vezes ao dia e permanece a uma
profundidade de oito metros por até 3 horas. Cada um recebe uma média de R$
3.500,00 por mês. Todavia, uma febre de origem desconhecida tomou de conta dos
mergulhadores nas últimas semanas. “Quando a gente chega ao hospital somos
medicados, melhoramos e retornamos ao trabalho. Depois a febre volta”, contou
um deles, informalmente.
Na balsa onde os mergulhadores
passam 24 horas – de domingo a domingo – há colchões em forma de beliche. No
domingo em que a Reportagem esteve no local eles estavam sem cozinheira. A
última havia se demitido. “Estamos precisando de uma (apontou para uma repórter
da equipe). O salário é até bom. Pagamos R$ 2.500,00 por mês”, disse um dos
garimpeiros.
A outra embarcação tem dois
andares e estava localizada dois quilômetros abaixo da primeira. Tem capacidade
para vasculhar o fundo do rio até 30 metros de profundidade, mas espera o nível
do rio baixar para poder procurar ouro e diamante no leito, onde creem que há
mais gemas preciosas.
Curiosamente, ninguém confessa
que a quantidade de ouro e diamante garimpados até agora cubra os custos da
busca pelo metal e pedra preciosa. “Estamos pegando pouco demais. Quase não
está valendo a pena”, disse um deles, possivelmente para despistar e afastar
possíveis assaltantes.
DNPM diz que não deu
autorização para lavra
A Reportagem entrou em contato
com o escritório do DNPM (Departamento Nacional de Produção Mineral), em Belém,
o qual informou que não concedeu licença para exploração mineral.
O técnico José Fernando da
Silva Lemos explicou que a pesquisa mineral obrigatoriamente implica obtenção
de amostras, que no caso de diamante exige grandes volumes, devido à
erraticidade na distribuição das pedras no aluvião. “No caso, pode ser que
esteja ocorrendo amostragem para definição de reservas”.
Embora os garimpeiros de um
dos grupos não tenham se identificado e nem o nome do responsável pela licença,
o DNPM informou que há autorização para amostragem para definição de reservas
em nome de José Manuel Carreteiro, a qual foi concedida em 14 de setembro do
ano passado e tem validade até setembro de 2018, com possibilidade de atuação
no lado de Itupiranga e Nova Ipixuna. Para essa atividade, a empresa informou
que deveria gastar R$ 59.620,00 com o projeto para atuar em uma área de 7.952
hectares.
Outro processo de requerimento
de pesquisa está em nome de Fabrício Ayres Estorari. Ele tem autorização para
fazer pesquisa em uma área de 8.000 hectares.
Um terceiro processo, também
autorizado para pesquisa minerária de diamante e ouro na mesma região recebeu
licença de pesquisa do DNPM em face de Ari Carneiro Moraes, o qual pode
vasculhar o fundo do rio em uma área de 1.500 hectares. Esse processo é mais
antigo, de 2012, e o requerente tem até julho de 2017 para encerrar os
trabalhos.
Depois que consegue o alvará
de pesquisa, a empresa entra no DNPM solicitando uma guia de autorização de
lavra. É apenas de posse desse documento que ela pode vender o minério que
encontrar durante a fase de pesquisa. “Se vender sem a guia será de forma
ilegal”, informou um geólogo consultado pelo Jornal. Em verdade, o DNPM observa
que nenhuma empresa ou pessoa física que requereu licença de pesquisa para a
região do Lourenção possui tal documento.
Consta no site do DNPM que foi
o geólogo marabaense Valfredo Gomes da Silva o responsável técnico pela
autorização de pesquisa dos 1.500 hectares de Ari Carneiro Moraes. No porto de
Marabá, ele construiu uma balsa imensa, tendo gasto mais de R$ 1 milhão e
ocupado cerca de 40 trabalhadores próximo ao balneário das Mangueiras.
Na vila do Tauri, próximo ao
pedral, os moradores dizem que os mergulhadores e demais trabalhadores chegam e
saem da comunidade sem tocar no assunto diamante e ouro. “Falam sobre outras
coisas, brincam, mas quando a gente pergunta se pegaram muito diamante, eles
mudam de assunto rapidinho”, diz o pescador Carlos José Lima, 44.
Garimpo inspirou filme e tinha
até lata de leite
Nos garimpos de diamante da
região de Ipixuna muita gente fez riqueza. Muitos dos garimpeiros se
concentraram na região do Pedral do Lourenção e de lá extraíram muitas pedras.
Mortes, traições, brigas, doenças e outros dilemas desse tipo de lugar fizeram
parte do cenário do garimpo.
Naquele tempo havia o costume
de guardar os diamantes que encontravam no fundo do rio dentro de uma lata de
leite ninho. As histórias contadas por ex-garimpeiros atestam isso. A
Reportagem encontrou em uma residência na Vila Tauri um desenho que retrata
essa realidade. “Muitos trocavam os diamantes que garimpavam por objetos banais
que alguns americanos traziam”, relembra José Lima Dias, 82, residente em
Marabá.
Por fim, o garimpo foi parar
na telona em 1966. Coube a Líbero Luxardo dirigir um filme patrocinado pelos
comerciantes marabaenses Pedro Bentes Pinheiro, Iran Bichara, Miguel Gomes da
Silva e Luso Solino.
O roteiro do filme conta que
João, um goiano que se fizera tropeiro e que, seguindo indicações de uma cigana,
foi procurar fortuna no garimpo - embora a cigana tivesse previsto que
encontraria também a desgraça.
João chega ao garimpo no
momento em que se encontra no auge a exploração movida por um aventureiro que,
utilizando o feitiço exercido por sua mulher sobre os garimpeiros, consegue
comprar suas pedras preciosas como se não tivessem quase nenhum valor. João
descobre a exploração e se torna líder dos garimpeiros. Em pouco tempo expulsa
o aventureiro. Trabalha no garimpo e consegue juntar várias pedras de valor.
Torna-se, entretanto, alvo da cobiça e do desejo de vingança de todos os
malfeitores da região dos garimpos. Envolvido em muitas lutas, João abandona
Flor, jovem da região que o conhece e ama, perde seu melhor amigo e decide
partir. No avião, entretanto, resolve voltar para vingar a morte do amigo e
procurar o amor da terna Flor.
(Ulisses Pompeu)
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