Simão Jatene e sua filha Isabela Jatene
Máquina assistencialista de
fabricar votos às custas do dinheiro público, o programa Pro Paz, do governo
estadual, está suspenso por determinação do governador Simão Jatene. Ele se
antecipou a possível um procedimento de apuração do Ministério Público, por
conta de denúncias de favorecimento político tanto a favor do próprio Simão
Jatene quanto da filha dele, Isabela Jatene, presidente do Pro Paz, decidindo
cancelar a caravana, que tinha roteiro de visitas a 37 municípios, até o final
de junho. Em plena campanha sucessória, o governador também nutre o temor de
vir a ser denunciado por crime eleitoral.
No final de novembro do ano
passado, o então ministro da Saúde, Alexandre Padilha, durante visita ao Pará,
injetou R$ 20 milhões no Pro Paz e no programa Olhar Brasil, parceiro da
caravana no atendimento oftalmológico. É norma que o dinheiro não utilizado no
programa para o qual foi destinado seja devolvido aos cofres públicos, mas o
governo não informou se isso já foi feito. A caravana do Pro Paz já havia percorrido
nos últimos três anos, a maioria das regiões do Estado, promovendo atendimento
médico em diversas especialidades, exames e distribuição de remédios.
A região do Marajó, mais
precisamente os municípios de Soure, Ponta de Pedras e Muaná, além de
Abaetetuba, na região nordeste, seriam visitados pelo ferry boat do projeto de
15 a 28 deste mês - ou seja, durante 13 dias. A caravana também iria pela
primeira vez aos municípios de Cametá, Mocajuba, Baião, Aveiro, Itaituba e
Jacareacanga, e passaria pelas regiões de integração do Tocantins, Xingu, Baixo
Amazonas e Tapajós. Seriam 102 dias de atendimento, em cinco meses de jornada
pelos rios do Pará, com final em junho.
“Não avisaram nada.
Suspenderam tudo, porque ouvi dizer que a caravana fazia mais política que
atendimento ao povo”, disse um militar da PM que constantemente fazia parte da
equipe que garantia a segurança dos envolvidos no projeto. Outro servidor do
Estado, pedindo para não ter o nome divulgado, disse que Jatene “ficou com
medo” que a Justiça determinasse a paralisação do programa. “Dizem que a filha
do governador é candidata e já estava fazendo campanha eleitoral
aproveitando-se do Pro Paz”, afirmou uma médica da equipe.
Máquina em ação
Apenas em 2013, de acordo com
o governo, entre pessoas atendidas e serviços realizados, como consultas e
exames médicos, assim como emissão de documentos, as caravanas
assistencialistas contabilizaram dois milhões de procedimentos.
Dos R$ 20 milhões do convênio
entre o governo estadual e o Ministério da Saúde, R$ 17 milhões seriam
incorporados ao teto anual de média e alta complexidade para as ações
desenvolvidas na caravana fluvial do Pro Paz.
Outros R$ 3,4 milhões são
destinados às ações do projeto Olhar Brasil, que se propõe a atuar na
identificação e na correção de problemas de visão dos educandos de escolas
vinculadas ao Programa Saúde na Escola (PSE) e dos alfabetizandos cadastrados
no Programa Brasil Alfabetizado (PBA), gerido pelo Ministério da Educação –
ações que se uniriam à Caravana Oftalmológica.
Uso político e irregularidades
como falta de licitações
Em uma série de reportagens
publicadas no ano passado, o DIÁRIO mostrou documentos que mostravam inúmeras
irregularidades, má formulação e planejamento de concepção do Pro Paz - que foi
criado para dar asas eleitorais a Jatene e sua filha. Uma das irregularidades
foi a contratação da empresa Humanitar para prestar serviços médicos nas
caravanas. Ela ganhou contrato sem se submeter ao processo de licitação. O
governo alegou que, em vez de licitação, fez “chamada pública”. Porém, só a
Humanitar se apresentou, o que levanta a suspeita de cartas marcadas para
favorecê-la. A habilitada foi o Instituto de Olhos Fábio Vieira S/S e somente
na especialidade de oftalmologia, conforme foi publicado no Diário Oficial do
dia 23 de setembro de 2013. Não havia qualquer registro sobre a empresa
Humanitar, pelo menos do Diário Oficial.
O governo sequer se dignou a
prestar informações sobre o valor pelo qual a Humanitar foi contratada para
prestar serviços ao Pro Paz. Como os donos da Humanitar e da empresa RPR, que
foi a empresa contratada por dispensa de licitação para atender o Pro Paz em
2012, são os mesmos, pode-se avaliar que o valor do contrato da Humanitar
jamais será inferior ao que foi pago em 2012 à RPR: R$ 24 milhões. Uma proeza
para uma empresa com apenas dois médicos cadastrados no conselho nacional da
entidade de saúde, que recebiam diárias de R$ 1,6 mil.
Outras irregularidades
envolvendo empresas favorecidas pelo programa estariam sendo analisadas pelo
Ministério Público. Ainda na fase de apuração, para posterior ajuizamento de
ações, já teriam sido detectados graves desajustes nos contratos. A informação
chegou ao governador, que, rápido como uma flecha, paralisou o Pro Paz antes
que ele fosse paralisado judicialmente. Mas há também um outro forte motivo: a
ciumeira de políticos do PSDB e da base aliada, que não têm vez no benefício
político-eleitoral do programa, considerado por eles como uma “mina de votos”.
O misto de insatisfação e
revolta com os privilégios à Isabela Jatene, tida como candidata à vaga de
deputada federal – o pai agora diz que ela estaria fora da disputa –, chegaram
aos ouvidos do governador. Para debelar as queixas e apagar a fogueira dos
revoltados, Jatene acabou com a caravana. Em trocados: a horta eleitoral de
Isabela e do pai secou em meio à adubação.
Governo admite: eleições
motivam viagens suspensas
Procurada pelo DIÁRIO, assessoria
de Jatene disse em nota que o governo do Estado suspendeu temporariamente a
programação da Caravana Pro Paz por cautela, “em função das eleições deste
ano”.
A nota diz ainda que o governo
tem sido alvo de “ataques infundados” que “deturpam o caráter social do
trabalho desenvolvido”, que já teria resultado em mais de dois milhões de
atendimentos. “O inegável alcance social do programa foi reconhecido,
inclusive, pelo próprio governo federal, que, por meio do Ministério da Saúde,
firmou convênio de R$ 20,4 milhões com o governo do Estado para realizar os
atendimentos, embora até o momento não tenha repassado o recurso”.
A nota informa ainda que o
governo desconhece e não foi notificado de nenhum embargo judicial às ações da
caravana. E anuncia que a Procuradoria Geral do Estado “fará uma consulta ao
Tribunal Regional Eleitoral sobre a possibilidade de continuação dos
atendimentos”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário